I – O SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO.
O conceito de sistema no ordenamento jurídico, consiste em um conjunto de elementos dotados de unidade interna, coerência lógica, ordem, ausência de contradições e independência do todo com relação às partes. A ideia de sistema está intimamente ligada à noção de pluralidade. A estrutura fundamental do sistema tributário são as bases econômicas de incidência independente das considerações sobre a pessoa jurídica titular da competência impositiva.[1]
Quando se fala em sistema tributário brasileiro, a noção fundamental é que a matriz do sistema é a Constituição Federal, que determina princípios, regras de competência tributária, tipos de tributos e repartição de receitas. O sistema tributário é decorrente do Estado Democrático de Direito e, desta forma, a ordem tributária deve estar em consonância com o Bem-Estar Social, Segurança Jurídica e Diminuição de Desigualdades. Desta forma, as regras do direito tributário brasileiro devem respeitar ordem constitucional.[2]
A ordem jurídica tributária brasileira constitui-se de um conjunto de normas constitucionais de natureza tributária, inserido no sistema jurídico global, formado por um conjunto unitário e ordenado de normas subordinadas aos princípios fundamentais reciprocamente harmônicos, que organiza os elementos constitutivos do Estado, que outra coisa não é a própria Constituição.
Os princípios constitucionais tributários representam um critério de interpretação e de integração, pois são eles que dão a coerência geral ao sistema. Portanto, os preceitos constitucionais tem de ser conjugados com os princípios e a integração há de ser feita, de tal sorte, que se tornem explícitas ou explicitáveis as normas que o legislador constituinte não quis ou não pode exprimir cabalmente.[3]
A base do ordenamento tributário brasileiro restringe a incidência dos tributos sobre: Renda (Trabalho e Capital), Propriedade (Transferência e Titularidade), Consumo (Bens e Serviços) e Folha de Salário.
A metodologia da aplicação das bases de incidência são: tributação sobre a renda, tributação sobre a propriedade (propriedade de bens, transferência de bens entre vivos e mortis causa), tributação sobre o consumo (faturamento e valor adicionado) e a tributação sobre a folha de salário (rendimentos auferidos pelo salário). A carga tributária brasileira é composta 50% de tributação sobre o consumo, 25% tributação sobre a folha de salário, 20% sobre a renda, 3% tributação sobre a propriedade e 2% outras fontes.
Um sistema tributário moderno, além de ter como escopo o financiamento das despesas do governo, deve também procurar atender a vários objetivos para que ele contribua para o desenvolvimento econômico e social do país. Os principais objetivos, de acordo com a leitura econômica que trata das finanças públicas, são: eficiência, simplicidade, flexibilidade, transparência, equidade e federalismo fiscal.[4]
Quando da análise da distribuição da carga tributária brasileira entre o consumo, renda, propriedade e folha de salário, verifica-se que a eficiência, a equidade e a simplicidade não são respeitadas no atual ordenamento tributário brasileiro e, desta forma, conclui-se pela existência de distorções no sistema tributário e uma necessidade de mudanças. Vale salientar que as mencionadas distorções são barreiras diretas ao crescimento econômico.
II – AS DISTORÇÕES DO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO.
A tributação no sistema jurídico tributário brasileiro é concentrada nos tributos sobre o consumo. O modelo brasileiro de tributação sobre o consumo é carregado de algumas distorções, sendo que a mais relevante é o não cumprimento da justiça distributiva.
A justiça distributiva tem como regra matriz a diminuição das desigualdades. Decorrem da justiça distributiva os princípios da seletividade, progressividade e capacidade contributiva. O fundamento da existência da justiça distributiva é a necessidade de transferência de renda, bem como, o suprimento de recursos para o Estado prestar seus serviços essenciais. A concretização ideal de equidade é a correta distribuição do ônus tributário e, desta forma, distribui-se a renda e os serviços públicos com o objetivo de tornar a sociedade mais igualitária.
O sistema brasileiro de tributação sobre o consumo, não respeita a não cumulatividade, uma vez que não permite a utilização integral do crédito financeiro e assim onera indiretamente as exportações e também aumentam o preço final dos bens e serviços e, por conseguinte, impede o crescimento econômico. Os tributos cumulativos têm incidência em cascata, aplicam-se ao faturamento e ao valor agregado e, portanto, sua incidência ocorre em todas as etapas da produção.[5]
A tributação sobre o consumo não é progressiva e, como a progressividade tem como objetivo a justiça distributiva, a tributação sobre o consumo não auxilia na correta distribuição de riquezas, quanto maior for a progressividade da tributação menor será as desigualdades sociais.
Ademais, os tributos sobre o consumo são regressivos, pois têm uma relação inversa com o nível de renda do contribuinte, prejudicando as pessoas de menor poder aquisitivo. Eles incidem sobre a produção e o consumo de bens e serviços, sendo passíveis de transferência para terceiros, ou seja, para os preços dos produtos. Os contribuintes na tributação sobre o consumo pagam os tributos por intermédio das empresas produtoras e vendedoras que são contribuintes legais, como o consumo é decrescente em relação a renda, isso prejudica os mais pobres.
Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, demonstra a regressividade do sistema tributário brasileiro: os 10% das famílias mais pobres do Brasil destinam 32% da renda disponível para o pagamento de tributos, enquanto o peso dos tributos cai para 21% da renda dos 10% mais ricos.[6]
As distorções do sistema tributário acarretam deficiência no crescimento econômico. Logo, surge a necessidade de regularização das distorções para proporcionar uma correção econômica, por isso surgem as ideias de reformas tributárias.
III – IDÉIAS DE REFORMA.
Importante observar que muitas são as ideias sobre reforma do sistema tributário brasileiro. No entanto, as ideias, na maioria das vezes, esbarram nos princípios constitucionais tributários e financeiros, logo, não se demonstram viáveis. É salutar observar que toda e qualquer proposta de reforma tributária deverá sempre ter como premissa o federalismo fiscal, ou seja, cada ente federado tem direito constitucional a uma parcela da arrecadação dos tributos, e este princípio não pode ser modificado, pois é uma cláusula pétrea.
Um sistema tributário ideal está calcado nas seguintes premissas: ciência econômica (eficiência econômica menos distorção na economia); simplicidade administrativa (facilidade na administração tributária); equidade (justiça distributiva); flexibilidade (possibilidade de o Estado intervir na economia de forma ágil) e reponsabilidade política (transparência).[7]
Seguindo a ideia de um sistema tributário ideal, o modelo tributário brasileiro deveria se fundamentar na tributação sobre a renda e patrimônio, uma vez que, se tributando a renda e o patrimônio consagra-se a justiça distributiva, por conseguinte, oportuniza-se à sociedade uma melhor distribuição da riqueza.
Ademais, a ordem tributária brasileira deveria se utilizar menos das contribuições sociais e readequar sua tributação por meio de alterações da legislação infraconstitucional.
Urge ao Estado brasileiro a necessidade de reformar seu sistema tributário, pois só através de um ordenamento fiscal eficiente e equânime será possível o retorno do desenvolvimento econômico.
Rafhael Pimentel Daniel
Mestrando em Direito Tributário pela Escola de Direito da FGV-SP.
Especialista em Direito Tributário MBA-FGV-RJ.
Especialista em Processo Civil Constitucional pela PUC/PR.
Advogado
[1] TORRES, Ricardo Lobo. CURSO DE DIREITO FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO. 19a Ed, revista e atualizada. Rio de Janeiro, 2013
[2] HARRADA, Kiyoshi. DIREITO FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO. 22a Ed. SÃO PAULO. Atlas. 2013
[3] MIRANDA, Jorge. MANUAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL. 3a Ed. COIMBRA. Editora Coimbra.
[4] ARVATE, Paulo Bidermann, Ciro (Org). ECONOMIA NO SETOR PÚBLICO. Rio de Janeiro. Elsevier, 2004.
[5] SAMPAIO, Maria da Conceição. Tributação do consumo no Brasil: Aspectos teóricos e aplicados, disponível em www.ediciplinas.usp.br
[6] www.ipea.gov.br
[7] STIGLITZ, Joseph E. ECONOMICS OF THE PLUBIC SECTOR. 3rd edition. New York: W.W.Norton & Company