O tributo e a relação jurídica tributária

O tributo e a relação jurídica tributária

A relação jurídica tributária[1] pode ser definida como o vínculo existente entre a Fazenda Pública e o Contribuinte, onde este elo é instituído por uma norma legal e tem como resultado uma obrigação que quando pecuniária,  denomina-se tributo, e, quando não pecuniária, nominada de obrigação acessória.[2] O tributo, produto desta relação jurídica, é definido pelo artigo 3º do Código Tributário Nacional e a obrigação acessória pelo artigo 115 do Código Tributário Nacional.

Logo, o conceito supramencionado, é claro em afirmar que a relação jurídica tributária é fundamental à norma legal[3], e, portanto, sua obrigação, o tributo, tem como estrutura elementar a lei[4]. Desta forma, toda e qualquer norma legal que embase a obrigação tributária, deverá ter sua forma alinhada com as premissas constitucionais tributárias[5].

Ao desmembrar essa relação jurídica tributária, vislumbra-se a obrigação tributária principal, caracterizada como o dever de pagamento, e se define como uma relação de crédito e débito, na qual a contribuinte tem o débito e a Fazenda Pública, o crédito. Importante observar que esta obrigação pecuniária denominada tributo existe como forma do Estado concretizar seus deveres institucionais, com intuito de garantir os direitos à sociedade, bem como implementar a justiça distributiva[6].

A eventual obrigação acessória que venha acompanhar a obrigação principal informada à Fazenda Pública, corresponde à obrigação de fazer ou não fazer. Vale salientar que, enquanto a obrigação principal está relacionada ao fato gerador, a obrigação acessória decorre da legislação tributária.[7]

A origem do tributo é concretizada pelo seu fato gerador[8], instituto do qual decorre a base de cálculo, a alíquota (aspectos quantitativos), a temporalidade e o sujeito (aspecto subjetivo).

            O fato gerador, conceituado pelo artigo 114 do Código Tributário Nacional, é representado por um ato, fato ou situação jurídica, previamente definido em norma legal de acordo com todas premissas constitucionais tributárias, que pode se dar no campo da norma ou da existência, por isso classificado como abstrato e concreto.

Tecnicamente, o fato gerador abstrato é a definição pura extraída da norma legal, por meio da qual traz os elementos de formação da obrigação tributária: o objeto, os sujeitos, o tempo, o espaço e quantidade. Por sua vez, o fato gerador concreto é a ocorrência no mundo real dos elementos do fato gerador abstrato. [9]

Em termos de estrutura normativa do fato gerador, o artigo 114 do Código Tributário Nacional determina que a expressão “fato gerador” deve ser antecedente à regra de incidência, ou seja, à descrição exata da situação que originará a obrigação tributária, e deve conter o objeto, o sujeito, o lugar e o tempo. Além do que, no fato gerador deve estar inserido o consequente, o dever de pagamento do tributo que tem como elementos quantitativos a alíquota e a base de cálculo.[10]

Os componentes alíquota e base de cálculo [11]são os elementos quantitativos do fato gerador. A alíquota[12] corresponde ao percentual incidente sobre a base de cálculo, ou um valor prefixado. Já a base de cálculo[13] é uma ordem de grandeza própria do aspecto quantitativo do fato gerador. A dinâmica da tributação impõe, para composição do crédito tributário, a necessidade de cálculo do tributo devido, operação, esta, que se concretiza por meio da aplicação da alíquota sobre a base de cálculo. Os elementos quantitativos do fato gerador estão obrigados ao Princípio da Legalidade, nos termos do artigo 97 parágrafo 1º do Código Tributário Nacional.

O aspecto espacial do fato gerador está relacionado ao lugar de concretização fato ou do ato jurídico que desencadeia a relação jurídica tributária, é um reflexo do Princípio da Territorialidade da norma tributária. No tocante ao critério temporal do fato gerador, é o momento que se dá a ocorrência do fato gerador, e não se confunde com o momento do pagamento do tributo. A temporalidade do fato gerador é regida pelo artigo 116 do Código Tributário Nacional.

Por fim, o aspecto subjetivo do fato gerador, elenca como sujeitos o ativo e o passivo da relação jurídica tributária[14]. Entende-se como sujeito ativo, o ente público que tem competência e/ou capacidade para instituir, fiscalizar e arrecadar o tributo. O sujeito passivo, por sua vez, é aquele na qual norma tributária determina o responsável pelo pagamento do tributo, direta ou indiretamente. Desta forma, os sujeitos da relação jurídica tributária estão intimamente ligados ao fato gerador, uma vez que ele direcionará a quem o tributo é devido, bem como quem deve pagá-lo.

Conclusivamente, os tributos nada mais são do que prestação pecuniária de uma obrigação tributária, nascida da relação jurídica tributária entre a Fazenda Pública e o Contribuinte, instaurada mediante concretização da hipótese previamente definida em lei, ou seja, do fato gerador, alíquota e base de cálculo.

[1] O reconhecimento formal da relação jurídica e muito simples, já que o operador identicamente modalizado (O, V e P), promovendo a síntese entre as condutas contrapostas de dois ou mais sujeitos, denuncia, imediatamente, a presença de enunciando relacional. Sua inclusão na classe dos liames de índole tributária, entretanto, vai depender da conexão que porventura mantenha com enunciado fático previsto na hipótese de regra matriz de incidência tributária, Sem esse nexo, não é possível assegurar que uma estrutura relacional qualquer, conquanto satisfaça os requisitos sintáticos de toda relação, assuma a categoria de vínculo jurídico tributário . Reside exatamente na correlação estabelecida com o antecedente da norma individual e concreta, fator  de identificação do liame relacional como sendo de índole tributária. E prova disso está no exame do vínculo jurídico qualquer. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributários – Fundamentos Jurídicos da Incidência. 3ª Ed, Revista e Atualizada. São Paulo: Saraiva 2004. p. 152

[2] Por força da ordem tributária, estabelece-se uma relação jurídica entre o Estado e o particular. Esta é a relação jurídica-tributária. Compreende, via de regra, uma série de vínculos, que não se limitam ao recolhimento do tributo. Basta ter em mente que além deste, o particular está sujeito ao dever de escriturar livros, preencher formulários, atender a fiscalização etc., para que se compreenda a complexidade da relação assim estabelecida. SCHOUERI, Luis Eduardo Direito Tributário. 8ed. São Paulo: Saraiva 2018. p.497

[3] A natureza ex lege do tributo tem matriz no art. 150, I da CF, segundo o qual é vedada à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça. O princípio da legalidade tributária, por configurar um direito fundamental do contribuinte, é protegido por cláusula pétrea, pelo que não é possível de supressão por emendas. HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 22 ed (Revista e Atualizada). São Paulo: Atlas 2013. p.317

[4] …obrigação tributária só pode resultar de lei. É a lei que elege certos fatos econômicos , aptos a suportar a imposição fiscal, como veículo de incidência tributária. Determinados fatos são abstratamente descritos na lei, tornando-se, assim, jurisdicizados, isto é aptos a gerar efeitos assim que concretizados no mundo fenomênico. HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 22 ed (Revista e Atualizada). São Paulo: Atlas 2013. p.515

[5] A relação jurídica tributária, por outro lado, aparece totalmente vinculada pelo direito fundamentais declarados na Constituição. Nasce por força de lei, no espaço previamente aberto pela liberdade individual ao poder impositivo estatal. É rigidamente controlada pelas garantias dos direitos e pelo sistema de princípios da segurança jurídica. Todas essas características fazem com que se neutralize a superioridade do Estado, decorrente dos interesses gerais que representa, sem que, todavia, se prejudique a publicidade do vínculo jurídico. TORRES, Ricardo Lobo, Curso de Direito Financeiro e Tributário. 19 Ed (Revista e Atualizada.). Rio de Janeiro: Renovar, 2013. p.237

[6] A existência do Estado Fiscal esta atrelada à existência de tributos. Na medida do agigantamento das tarefas estatais, cabe ao ordenamento prever os meio para o Estado financiar seus gastos. Cogita-se, aqui, obtenção de receita pública. SCHOUERI, Luis Eduardo Direito Tributário. 8ed. São Paulo: Saraiva 2018. p.129

[7] De fato, já da leitura do artigo 113 do Código Tributário Nacional, se observa que enquanto a obrigação principal se relaciona com o fato gerador, a obrigação assessoria decorre da legislação tributária. Evidenciando-se que no último caso, o legislador complementar não quis que o dever assim sugerido se submetesse ao Princípio da Legalidade tributária, fundamentado que está no fato de que não há, nesse caso, instituições ou aumento do tributo. SCHOUERI, Luis Eduardo Direito Tributário. 8ed. São Paulo: Saraiva 2018. p.500

[8] Essa expressão fato gerador, empregada pelo CTN, tem merecido violentas críticas por certos setores da doutrina, sob alegação de que nada gera, a não ser confusão na mente do jurista. Por isso, preferem a expressão hipótese de incidência ou hipótese tributária para designar a descrição legislativa de um fato, e a expressão fato imponível ou fato jurídico tributário ou ainda hipótese de incidência realizada para realizar o fato concreto, localizado no tempo e no espaço. Com a devida vênia, é bem difícil um jurista confundir a descrição do fato gerador com sua concreção. Assim, se a primeira expressão gera confusão , a segunda , também, pode incidir em equivoco. HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 22 ed (Revista e Atualizada). São Paulo: Atlas 2013. p.516.

[9] A fenomenologia do fato gerador segue as regras do silogismo jurídico, do qual o exemplo clássico é o seguinte: todo homem é mortal (premissa maior);  Sócrates é homem (premissa menor); logo Sócrates é homem (conclusão). Assim, o fato gerador abstrato é a premissa maior, o fato concreto, a premissa menor e a conclusão resulta subsunção do fato individual na situação abstrata. De observar que a subsunção não é puramente lógica, pois depende da interpretação e da compreensão do fato descrito na norma e da qualificação do fato concreto (inexiste interpretação do fato), pelo que a inferência ou conclusão não chega a trazer qualquer novidade que não se contenha nas premissas previamente interpretadas e qualificadas. Assim sendo, se o fato gerador abstrato cria a obrigação tributária e se o fato gerador concreto se subsume no abstrato, segue-se  que nascerá obrigação de pagamento do tributo. TORRES, Ricardo Lobo, Curso de Direito Financeiro e Tributário. 19 Ed (Revista e Atualizada.). Rio de Janeiro: Renovar, 2013. p.245

[10] Por outro lado a doutrina e a jurisprudência brasileira confundiram o fato gerador com o antecedente  (TATBESTAND) e o consequente (RECHTSFOLGE) da regra de incidência, gerando inúmeras impropriedades em torno dos conceitos indeterminados, da cláusulas gerais e dos tipos, bem como entre a subsunção e a coordenação dos tipos. Exceção e a bora de Paulo de Barros Carvalho e de seus discípulos que distinguem claramente entre regra matriz de incidência e fato gerador. TORRES, Ricardo Lobo, Curso de Direito Financeiro e Tributário. 19 Ed (Revista e Atualizada.). Rio de Janeiro: Renovar, 2013. p.247

[11] No elemento quantitativo estarão presentes os fatores de composição do valor pecuniário, que há de ser, necessariamente, o objeto da prestação. Repousa aqui o sainete próprio da categoria obrigacional, em face das demais relações tributárias, de modo que o grupo de indicações que o interprete obtém, na leitura atenta dos textos legais, e que lhe torna possível precisar com segurança, a exata quantia devida a título de tributo, é aquilo que chamo de elemento quantitativo do fato jurídico tributário. Invariavelmente, virá explícito pela conjugação de duas entidades: base de cálculo e alíquota, e sua pesquisa e determinação espertam enorme interesse, porquanto é de suma relevância para desvelar peculiaridades ínsitas à natureza do gravame. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributários – Fundamentos Jurídicos da Incidência. 3ª Ed, Revista e Atualizada. São Paulo: Saraiva 2004. p. 175

[12] …dá a compostura numérica da dívida produzindo o valor que é exigido pelo sujeito ativo, em cumprimento da obrigação que acaba de nascer. Volto a dizer que, em termos sintáticos –semânticos, sua presença, é obrigatória, posta a necessidade constitucional da existência da base de cálculo , constante se vê dos art. 145, parágrafo 2º e 154 inciso I. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributários – Fundamentos Jurídicos da Incidência. 3ª Ed, Revista e Atualizada. São Paulo: Saraiva 2004. p. 185

[13] Tenho por mim, por isso mesmo, que a base de calculada é a grandeza presente no elemento quantitativo da relação jurídica tributária, cumprindo papel mensurador e determinativo do valor que deve ser prestado a título de tributo. Isso não impede que, paralelamente, tenha condão de confirmar, infirmar ou afirmar elemento material expressa na composição do antecedente da norma individual e concreta. Essas reflexões nos conduzem a ver, na base de calculada, três funções nitidamente distintas: a) medir as proporções reais do fato, ou função mensurada; b) compor a específica determinação da dívida, ou função objetiva; e c) confirmar, infirmar  ou afirmar o correto elemento material do antecedente normativo, ou função comparativa. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributários – Fundamentos Jurídicos da Incidência. 3ª Ed, Revista e Atualizada. São Paulo: Saraiva 2004. p. 175

[14] É no critério pessoal do consequente das normas tributárias gerias e abstratas que vamos encontrar os dados indicativos para reconhecer os sujeitos ativo e passivo da relação jurídica do tributo. Feita a subsunção do fato à norma, ao montar a estrutura da relação jurídica, apontaremos, fundados naquela diretriz, as pessoas físicas ou jurídicas que ficarão atreladas até que o vínculo se desfaça. CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributários – Fundamentos Jurídicos da Incidência. 3ª Ed, Revista e Atualizada. São Paulo: Saraiva 2004. p. 152

 

Rafhael Pimentel Daniel

Mestrando em Direito Tributário pela Escola de Direito da FGV-SP.

Especialista em Direito Tributário MBA-FGV-RJ.

Especialista em Processo Civil Constitucional pela PUC/PR.

Advogado

 

Balaban

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