O Planejamento Tributário: Uma reflexão sobre a Elisão, Evasão e Sonegação Fiscal.

Por: Rafhael Pimentel Daniel.

Pós Graduado em Processo Civil PUC/PR

Pós Graduado em Direito Tributário FGV/RJ

Mestrando em Direito Tributário Aplicado pela FGV/SP.

 

I – Introdução.

 

A complexidade do sistema tributário, aliado a alta carga tributária, exige a criação de mecanismos para que o contribuinte, busque alternativas, visando: diminuir incidência de tributos, diferir a incidência de tributos e evitar a incidência de tributos.

O planejamento tributário é uma garantia constitucional do contribuinte. O ato do contribuinte buscar a economia fiscal, através da gestão tributária, está lastreado no Princípio da Liberdade, conforme disciplina o artigo 5º, caput, da Constituição Federal. As decorrências do mencionado preceito fundamental são: o Princípio da Livre Iniciativa (artigo 1º inciso IV da Constituição Federal); o Princípio da Livre Concorrência (artigo 170º caput da Constituição Federal) e o Princípio do Fim Social dos Contratos e da Empresa[1].

Desta forma, o contribuinte dentro da licitude, poderá gerir de forma racional, a incidência tributária em suas operações, com proteção constitucional, não podendo o arbítrio dos órgãos fazendários atacá-lo.

Ricardo Lobo Torres[2] ensina:

O contribuinte tem plena liberdade para conduzir os seus negócios de modo que lhe prouver. O combate a elisão não pode significar restrições ao planejamento tributário. O campo da liberdade de iniciativa é ponto de partida para vida econômica e não pode sofrer interferências por parte do Estado. O contribuinte é livre para optar pela estruturação de seus negócios e pela formatação de sua empresa de modo que lhe permita a economia do imposto.

 

O elemento básico do planejamento fiscal é o Princípio da Liberdade, garantia constitucional, que garante ao contribuinte organizar sua vida econômica de forma a pagar menos tributos. Todavia, importante salientar a figura do “BUSINESS PURPOSE”, ou seja, o propósito negocial, muito embora não esteja positivado no ordenamento jurídico brasileiro, a jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, tem feito menções ao propósito negocial, sendo importante seu estudo para este trabalho.

O Princípio da Liberdade e suas derivações são os fundamentos constitucionais do planejamento tributário. Contudo, o estudo do propósito negocial, se faz importante em razão de alguns doutrinadores e em algumas decisões administrativas, apontem o propósito negocial como sendo ele, o fundamento da gestão tributária.

A jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais[3], já se posicionou, sobre o propósito negocial ser o fundamento do planejamento tributário.

ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA – IRPJ Ano-calendário: 2005 GLOSA DE AMORTIZAÇÃO DE ÁGIO INTERNO (ÁGIO DE SI MESMO) E CONCOMITANTE TRIBUTAÇÃO DO GANHO DE CAPITAL. IMPOSSIBILIDADE. As premissas básicas para amortização de ágio, com fulcro nos art. 7o., inciso III, e 8o. da Lei 9.532 de 1997, são: i) o efetivo pagamento do custo total de aquisição, inclusive o ágio; ii) a realização das operações originais entre partes não ligadas; iii) seja demonstrada a lisura na avaliação da empresa adquirida, bem como a expectativa de rentabilidade futura. Nesse contexto, correta a glosa da amortização do chamado “ágio interno” ou “ágio de si mesmo”. Todavia, desconsiderados os efeitos tributários da amortização do ágio, em face da artificialidade das operações e da falta de propósito negocial, também não é cabível a concomitante tributação de ofício do ganho de capital apurado nessas operações. Uma vez que o Grupo Empresarial reconheceu tacitamente a impropriedade, desistindo do recurso no que tange a glosa do ágio e respectiva multa de ofício, cumpre cancelar a tributação do ganho de capital, determinando-se sejam escoimados todos os efeitos contábeis e fiscais dessas operações. RECURSO DE OFÍCIO. PERDA DE OBJETO. Deixa-se de apreciar o mérito do recurso de ofício pela perda do objeto, em face do provimento do recurso voluntário e desistência parcial do contribuinte. Recurso de Oficio Negado. Recurso Voluntário Provido.(Data da Sessão: 12/06/2012; No Acórdão: 1402-01.080)

 

O instituto do propósito negocial, determina que os contribuinte não tem a liberdade para realizar operações com o intuito de pagar o menor encargo tributário, a economia deveria ser decorrente de transações que possuíssem outras finalidade. Logo,  a razão de ser da gestão tributária seria econômica, social e comercial e não propriamente tributária.

O propósito negocial não foi regulamentado no Estado Brasileiro e como o Direito Tributário, está pautada no Princípio da Legalidade Estrita pode-se afirmar que, muito embora o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais já tenha utilizado a teoria em alguns jugados, não se pode dizer, que o propósito negocial é o fundamento do planejamento tributário. Isto posto, com base no Princípio da Liberdade, enquanto não houver regulamentação expressa sobre o propósito negocial, o planejamento tributário continuará tendo como finalidade a economia de tributos. A gestão fiscal deverá sempre estar pautadas em atos lícitos amparados nos institutos do Direito Societário, Direito Civil e da interpretação das normas de Direito Tributário.

O Conselho Administrativo Recursos Fiscais [4] já se manifestou:

MULTA QUALIFICADA Em suposto planejamento tributário, quando identificada a convicção do contribuinte de estar agindo segundo o permissivo legal, sem ocultação da prática e da intenção final dos seus negócios, não há como ser reconhecido o dolo necessário à qualificação da multa, elemento este constante do caput dos arts. 71 a 73 da Lei n° 4.502/64. Acordão: 2202­002.167 – 2a Câmara / 2a Turma Ordinária, sessão: 19 de fevereiro de 2013.

 

            O planejamento tributário instrumento hábil para diminuição da carga tributária, deve-se pautar sempre na licitude de seus atos para poder utilizar da proteção do Princípio da Liberdade. O contribuinte, quando, utiliza-se de meio ilícitos para realização de sua economia fiscal, descaracteriza o planejamento tributário, para evasão fiscal e ou sonegação fiscal. Portanto, os ilícitos serão os limites do planejamento tributário.

 

II – Dos limites do planejamento tributários.

 

O limite do planejamento tributário e a caracterização dos seus atos jurídicos em lícito ou ilícitos. Quando se fala em os atos ilícitos no planejamento tributário, pode-se dividi-los grupos: O primeiro seria o ilícito penal, o planejamento tributário, no qual se cometeu um ilícito penal está maculado, e desta forma, o planejamento tributário se transforma em sonegação fiscal, crime punido de acordo com a lei penal. O segundo ilícito relaciona-se com o ilícito civil: abuso de direito, fraude à lei e simulação. Em razão de ser uma agressão ao ordenamento jurídico, desqualifica o planejamento tributário e o transmuta à figura da evasão fiscal. A terceira forma de ilícito seria aquele contra leis especiais ligadas ao direito administrativo, fato que também desqualificaria o planejamento tributário em evasão fiscal. O quarto grupo seria os ilícitos tributários, ou seja, infrações tributárias aqueles decorrentes de descumprimentos da Legislação Tributária, atos que transformam o planejamento tributário em evasão fiscal[5].

 

III – A Evasão Fiscal, a Elisão Fiscal e a Sonegação Fiscal.

 

            A elisão fiscal é forma lícita e razoável de o contribuinte economizar tributos. É realizada através da interpretação da Legislação Tributária, da utilização dos institutos do Direito Societário e do Direito Civil. É sinônimo de planejamento tributário e ou gestão tributária. Deriva da expressão inglesa “Tax avoidance”. A doutrina muito discute sobre diferença ou não dos institutos, todavia, adotando-se o posicionamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, entende-se que na verdade a elisão fiscal e o planejamento tributário são sinônimos de um mesmo instituto.

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, posiciona-se:

ELISÃO FISCAL. NÃO OCORRÊNCIA[6]. Para que se possa falar de elisão fiscal há de ser obstada a ocorrência do fato gerador do tributo e por meio de ato lícito. Se o ato praticado, ainda que lícito, é concomitante ou posterior à ocorrência da hipótese de incidência, não cabe falar em planejamento tributário e devido é o tributo que se tentou evitar. Recurso negado. Acordão 204-02199, sessão: 27/02/2007.

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO[7]. ELISÃO. EVASÃO. Em direito tributário não existe o menor problema em a pessoa agir para reduzir sua carga tributária, desde que atue por meios lícitos (elisão). A grande infração em tributação é agir intencionalmente para esconder do credor os fatos tributáveis (sonegação).Desde que o contribuinte atue conforme a lei, ele pode fazer seu planejamento tributário para reduzir sua carga tributária. 0 fato de sua conduta ser intencional (artificial), não traz qualquer vicio. Estranho seria supor que as pessoas  pudessem buscar economia tributária licita se agissem de modo casual, ou que o efeito tributário fosse acidental. Acordão: 1101-000.710. Sessão: 11/04/2012.

            A expressão evasão fiscal, advinda do termo “tax evasion” é um ilícito tributário. O contribuinte, cometendo um ilícito civil com consequências na Legislação Tributária ou mesmo desvirtuando a interpretação da Legislação Tributária contamina o planejamento tributário, o transformando em evasão fiscal. Vale salientar, que a evasão fiscal, não é tipo penal, logo se diferencia da sonegação fiscal. Desta forma, muito embora, ocorram divergência doutrinarias e mesmo na jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, seguindo os ensinamento de Marco Aurélio Greco[8], a evasão fiscal, é mero ilícito tributário ou extra tributário.

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, define um caso clássico de sonegação fiscal que é livros contábeis com informações diferente das declarações prestadas a Secretaria da Receita Federal, como sendo evasão fiscal. Já nesta decisão, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, define a evasão fiscal, como infração tributária.

EVASÃO FISCAL[9]. A adoção de instrumento formal expressamente vedado por lei para elidir a ocorrência do fato gerador autoriza a exigência do tributo que seria devido se a forma empregada fosse a obrigatória. Acordão: 204-01939. Sessão: 07/11/2006.

Seguindo o entendimento que a evasão fiscal é um delito administrativo, punido com uma sanção pecuniária, disciplinada pela Legislação Tributária.

            A sonegação fiscal é um delito penal, o qual esta tipificado em lei penal especial, diferencia da evasão fiscal que um delito tributário que não reflete na esfera da liberdade individual do contribuinte e apenas na ceara patrimonial.

O ilícito penal tributário, é material e exige o dano, pois ele é tipificado pela lesão ao erário público, vem disciplinado pelos artigos 1º e 2º da Lei Ordinária 8137/1990 e pelo artigo 337-A do Código Penal.

Hector Villegas[10] explica:

que a fraude penal consiste em manobras intencionalmente dirigidas a aludir à administração tributária, produzindo uma falsa imagem de realidade.

Desta forma, a sonegação fiscal deve ser punida nos termos da Lei Penal, já a evasão fiscal deve ser combatida com as multas administrativas tributárias.

Hugo de Brito Machado[11], orienta:

Em face do elemento finalístico, tem-se de considerar que a lei, ao definir os crimes contra a ordem tributária, não pretendeu, nem pode ter pretendido substituir o sistema de cobrança de tributos pela ameaça de prisão. A finalidade da norma penal tributária, no caso, é proteger o direito do Estado aos elementos de que necessita para exercitar a atividade tributária, vale dizer, as informações concernentes aos fato. E assim, na verdade definiu como crime a ocultação, total ou parcial, de fato relevante para efeitos tributários.

            Quando, acontecer no planejamento tributário, a sonegação fiscal, como é tipificada na Legislação Penal, mais especificamente adulteração de registros contábeis, declarações falsas, omissões de receitas, dentre outras condutas, com o intuito de economizar tributos, o planejamento tributário deixará de existir, e surgirá a figura do delito criminal que será combatido pela persecução criminal.

 

IV –  Conclusão.

 

A licitude determina que todos os atos e fatos cometidos pelo contribuinte com o intuito de diminuir a incidência de tributos, postergar a incidência de tributos e evitar a incidência de tributos devem estar dentro do que o direito diz ser lícito. A ilicitude de qualquer ato macula todo um planejamento tributário.

Sendo assim, o planejamento tributário, composto por atos lícitos terá seu fundamento no Princípio da Liberdade. E se dará através da liberdade de forma, utilizando-se de instrumentos originários do Direito Societário, Direito Civil e da interpretação da Legislação Tributária, para ser elaborado.

Partindo-se da interação entre doutrina e jurisprudência, se chega a conceitos do institutos da evasão fiscal, da elisão fiscal, do planejamento tributário e da sonegação fiscal.

A questão principal entre a distinção dos institutos da elisão fiscal, evasão fiscal e sonegação fiscal é a licitude do ato jurídico fundamento do projeto de planejamento tributário. Se for lícito, o planejamento será um a elisão fiscal, o ato jurídico estiver ceifado de nulidades na sua composição que ferem o ordenamento jurídico civil, administrativo e ou tributários, então o planejamento tributário será uma evasão fiscal. Já se o ilícito for tipificada pela Lei de Crimes Contra Ordem Tributária ocorre então a sonegação fiscal.

Tendo, as definições dos institutos supramencionados, concluir-se-á, que a evasão fiscal é ilícito tributário, punido com uma sanção pecuniária, que a sonegação fiscal é um ilícito penal, tipificado em lei especifica, que tem por fim a perda da liberdade. A elisão fiscal e o planejamento tributário são sinônimos, se caracterizam como mecanismo lícito de economia de tributos.

 

 

[1] GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. São Paulo: Dialética. 2004. p.109.

[2] TORRES, Ricardo Lobo. Planejamento Tributário, elisão abusiva e evasão fiscal. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2012. p 10.

[3]http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf.

 

[4]http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf. Acesso 06 de abril de 2013.

 

[5] GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. São Paulo: Dialética. 2004. p. 79, 80 e 81.

[6]https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf.

[7]http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf.

 

[8] GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. São Paulo: Dialética.

[9]https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf.

[10] VILLEGAS, Hector. Direito penal tributário, apud YAMASHITA, Douglas. Elisão e evasão de tributos, planejamento tributário: limites à luz do abuso do direito e da fraude a lei. São Paulo. Lex Editora: 2005. p. 252.

[11] cursoparaconcursos.lfg.com.br/index.php?modulo=eva…acesso em: 12 abr.2013.

Balaban

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